Aurélio Buarque de Holanda
Aurélio Buarque Cavalcanti Ferreira nasceu em Passo de Camaragibe/AL em 03 de Maio de 1910. Lexicógrafo, filólogo, tradutor, crítico literário, escritor e professor. Passa a infância em Porto das Pedras, Alagoas, e inicia os estudos em Maceió. Cursa os preparatórios no Liceu Alagoano e desde os 15 anos atua como professor. Em 1930, aproxima-se de um grupo de intelectuais com forte influência no Nordeste, do qual fazem parte, entre outros, José Lins do Rego (1901-1957), Graciliano Ramos (1892-1953) e Rachel de Queiroz (1910-2003).
Aos 21 anos adota o nome Aurélio Buarque de Holanda Ferreira, incorporando o sobrenome da família materna. Ingressa na Faculdade de Direito do Recife em 1932 e conclui o curso quatro anos depois. A morte do pai, em 1935, lhe serve de inspiração para o conto “O Chapéu do Meu Pai”, publicado em 1941, no volume “Dois Mundos”.
Entre 1936 e 1937, dá aulas de português, literatura e francês no Colégio Estadual de Alagoas. Após ocupar cargos na Prefeitura de Maceió, como o de oficial de gabinete e de diretor da Biblioteca Municipal, transfere-se para o Rio de Janeiro em 1938 e passa a trabalhar como professor de língua portuguesa no Colégio Pedro II e no Instituto Rio Branco. A partir de 1939, atua na imprensa carioca: primeiramente como secretário da Revista do Brasil, período em que se aproxima do tradutor e linguista húngaro Paulo Rónai (1907-1992) – com quem publica, a partir de 1945, os dez volumes de “Mar de Histórias: Antologia do Conto Mundial” -, e entre 1947 e 1960 produz textos para a coluna O Conto da Semana, do suplemento literário do jornal carioca Diário de Notícias.
A convite de Manuel Bandeira (1886-1968) realiza, em 1940, sua primeira colaboração com dicionários – atividade responsável por sua notoriedade -, levantando brasileirismos para o Pequeno Dicionário Brasileiro da Língua Portuguesa. Ainda em razão de seu contato com o Ministério das Relações Exteriores, existente desde 1938, ocupa, de 1954 a 1955, a cadeira de estudos brasileiros na Universidade Autônoma do México (Unam). Bacharel em direito, autodidata, elege-se para a Academia Brasileira de Filologia, em 1956.
Publica, em 1958, “Enriqueça o Seu Vocabulário”, reunião de verbetes divulgados na revista Seleções Reader’s Digest desde 1950. Na década de 1960, integra a Comissão Machado de Assis, responsável pelo estabelecimento de textos originais do autor. Ingressa na Academia Brasileira de Letras (ABL) em 1961, ocupando a cadeira número 30. Seu trabalho fundamental, Novo Dicionário da Língua Portuguesa, conhecido popularmente como “Dicionário Aurélio”, sai em 1975.
Morreu no Rio de Janeiro/RJ, em 28 de Fevereiro de 1989
O chapéu acompanha meu Pai nos seus movimentos, sombreando-lhe um tanto a face. Está no seu verdadeiro lugar, a cabeça de meu Pai. Sim, está. Lá vem o velho chegando para casa, nos fins de tarde, cansado, já doente. Lá vem. É ele: o chapéu marrom, comum, desabado na frente, aquele jeito de andar, meio curvado, lento, da velhice. Chega. Empurra um lado da veneziana, puxa o ferrolho, entra. Põe o chapéu no cabide, ali mesmo onde o vejo agora, bem junto do espelho do móvel. Algumas vezes, olha-se ao espelho, cofia rápido o bigode, e vai entrando. Na sala de jantar, senta-se e com minha Mãe começa a falar das eternas coisas do dia-a-dia. Mamãe conta dos incidentes domésticos: falta de água; o leite que talhou, aborrecimentos com a empregada, “uma grandessíssima respondona”. Meu Pai se queixa dos negócios, que vão de mal a pior – “uma crise pavorosa, o comércio um paradeiro medonho, e o governo é impostos, e mais impostos um fim de mundo”. Mamãe é mais calma: – “Ora homem! Vamos vivendo. Os meninos trabalham, vão ajudando. Já estamos velhos. Paciência.” Ele dirá que trabalhou a vida toda, e era para ter uma velhice descansada.
O Chapéu do Meu Pai